sábado, 26 de junho de 2010

DILI 1974 - MANIFESTAÇÃO A ALMEIDA SANTOS



Nestes tempos em que os nossos “navegadores”, na África do Sul, procuram no meio de procelas futebolísticas, de novo, dobrarem o Cabo das Tormentas com rumo à imortalidade, naveguei eu também, mas na internet.
As descobertas de antanho foram pequenas em comparação a uma fotografia que descobri. Ela é um documento histórico do passado, e nela mergulhei, até porque pessoalmente e em função das pessoas que lá aparecem, me aniquilaram segundos de intenso amor, saudade e mágoa.
E, se do meu passado, me vieram essas lembranças, também de um presente não muito longínquo, me veio a lembrança de um texto sobre esse assunto, escrito no livro “Buan, Buan, Buan” que não resisto a transcrever:


*
“Timor, especialmente Díli, dia a dia ficava mais mergulhada na liberdade nova palavra que na realidade significava o caos. Os slogans importados, sabe Deus de onde, enchiam as paredes como prova cabal de que os bons e educados costumes estavam já ultrapassados. Os jovens em nome de uma nova era política, apedrejavam nas ruas a polícia e elementos de outros partidos, criando uma instabilidade propícia aos desígnios de outros, que na sombra manobravam os cordelinhos, com polegares levantados em forma de aquiescência e apoio. Matavam-se os irmãos para se dar lugar a uns mencionados primos, os quais esfregavam as mãos em grande gozo político. Os serviços secretos Indonésios, esses estavam a levar bem a água ao seu moinho, dominando a situação política a seu belo prazer.
No meio de toda esta confusão eu apenas saía de casa para o jardim do padre reitor, e rezava para que toda esta barafunda passasse rapidamente.
No cerne da nova ordem que as forças policiais não podiam, ou não queriam pôr cobro, surgiu a notícia de que vinha um ministro de Portugal, para in loco apreciar se o “Transatlântico parado no meio do oceano” estava já andando para o lado Indonésio, ou nem por isso. Foi o pandemónio. Das montanhas desceram os fantasmas do passado em forma de bandeiras velhinhas, tão velhas que ao passarem transportadas por velhos montanheses de longas barbas brancas, nos sentíamos na obrigação de ajoelhar em homenagem a um passado já passado, que se erguia orgulhoso, antes de ser traído, e tombar para sempre nas tumbas do obsoleto. O Ministro chegou por fim a essa ilha em forma de crocodilo, quedou-se emocionado, soltou um gemido e algumas lágrimas do supradito e regressou muito depressa, para nas entrelinhas das suas novas declarações em forma de arrependimento, dizer que era necessário acelerar a confecção da sopa que estava a ser cozinhada. O destino de Timor estava traçado. Muitos milhares, embalados mais uma vez nas palavras fingidas de um lado, e radicais do outro, estavam psicologicamente preparados para serem imolados no altar da hipocrisia e da ganância do poder, caminhando por entre cânticos ardentes de revolução e outras cantigas antigas, inevitavelmente, em direcção do holocausto.”


"in Buan,Buan,Buan"
mco

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