sábado, 14 de julho de 2007

As Terras de Rai Maliak

Nas profundezas de Timor, onde só chega quem quer lá chegar e entre as montanhas de Buburssusso e Caicassa, serpenteia a ribeira de Laclo do Sul.

Se a descida de Caicassa para a ribeira põe o coração num constante sobressalto, principalmente se usamos o cavalo como meio de locomoção, não ficaremos mais descansados ao chegar a ribeira.

Ao medo da descida "se o cavalo escorrega, ou tropeça," sucede a apreensão e sentimento de pequenez pela grandiosidade e aridez desse vale.

O leito da ribeira, alarga-se do sopé de uma montanha, ate ao sopé da outra. O deserto de areia e pedras vem lá de cima, pois que vemos a próxima curva da ribeira como que ao nível dos nossos olhos, e e com apreensão que iniciamos a travessia, rogando a Deus que não venha uma enxurrada por ai abaixo.

Dos dois lados da ribeira as montanhas erguem-se abruptas e se o sol não esta a passar mesmo por de cima, este vale cobre-se de sombras feitas pelas escarpas circundantes.

A agua de coco "nun kau" que bebemos em Caicassa, e que nos soube melhor que qualquer refrigerante, já lá vai e a boca torna-se seca e com sabor a pó e a areia.

O deserto pedregoso que nos rodeia faz-nos pensar em almas penadas, dançando ao ritmo dos remoinhos do vento que sopra e cujas penas sejam as de rondarem eternamente, este solitário ermo.

O caminho-de-pé-posto, qual auto-estrada, serpenteia pela ribeira ate ao ponto onde se subdivide, subindo um em direcção ao reino de Buburssusso e o outro pela ribeira abaixo, para mais alem, subir também a montanha para o suco de Fahi-Nehan. Seguindo o segundo caminho o que segue em direcção de Fahi-Nehan, iremos encontrar um pouco mais a baixo do começo dessa subida, outro desvio que nos levara ribeira a baixo ate a entrada de RAI MALIAK.

O local e árido, seco e deserto. Algumas arvores das quais resta muito pouco e bastantes "Ai lokes" alem do capim, são a vegetação predominante da pequena planície que e cercada de montanhas a toda a volta, num circulo perfeito, com apenas uma entrada que fica virada para a Ribeira.

Paramos em Rai Maliak para nos refrescarmos e porque o local me enchera de espanto. Os velhos disseram-me que antigamente no tempo dos avos teria havia ali uma povoação muito grande, com muita gente, mas um dia foram todos embora, não se sabe para onde.

As minhas perguntas foram a pouco e pouco ficando sem resposta, mas pelos olhos dos velhos vi que as respostas existiam mas eram já do reino do sobrenatural.

Sentei-me numa pedra que se encontrava a sombra de um ai loke, e pus-me a pensar como seria este local, numa noite de lua cheia.

Ribeira a baixo em direcção a planície de Hai Naruk, embalado pelo andar bamboleante do cavalo, ia sonhando que um dia havia de voltar, na tal noite de lua cheia, quando todas as almas que por ali andavam se libertassem dos seus corpos de veados para dançarem languidamente ao som do tebe.



"Viagens por esse Timor fora"
Manuel Mau Kruma

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