sábado, 5 de dezembro de 2015



 No meu livro “Retalhos de uma vida em Timor”
UM PM EM CUECAS

 
A vida em Timor era um pouco monótona para os militares que não tinham lá família. A vida social era limitada às pessoas que lá viviam, ou àquelas, mesmo militares, que mercê das suas posições e profissões, tinham o privilégio de puderem entrar no selectivo meio social da então Província.
Todo este introito não serve para justificar o que não tinha justificação, mas é talvez uma imagem da vida preconceituosa que se vivia lá.
O contacto dos militares com o meio civil, trazia inúmeras vezes, casos de namoros e de infidelidades, muitas vezes com resultados negativos para os seus intervenientes.
Esta pequena história quase que é uma dessas vezes, mas teve um fim feliz, porque a sorte determinou que tudo acabasse bem.
Um amigo meu, mantinha um namoro casto com uma senhora casada. O marido, segundo ela, rara era a noite que não chegava bêbado a casa e tratava-a muito mal.
Ao fim de muito tempo deste namoro platónico, ele teve por fim um convite para um encontro. Seria numa noite que ela achava propício, porque o marido deveria sair e chegar tarde. O convite era para ele a ir visitar na sua própria casa.
Tudo teria corrido de forma diferente, se por azar, ele nessa mesma noite, não se encontrasse de serviço de ronda à cidade.
Com o desespero por perder o tão desejado convite, pois nessa ocasião as trocas de serviço estavam proibidas, esse meu colega pediu-me que o acompanhasse nessa noite na ronda de Jeep, e o deixasse no local combinado.
Assim, nessa noite, os dois fardados a rigor, saímos no jeep de ronda direitos ao sítio planeado.
Rolamos então na noite quente de Díli, onde os grilos, as rãs e os tokés desafiavam as eternas músicas que a rádio derramava no espaço, com o seu programa de “música a seu gosto”, fazendo horas para o tão almejado interlúdio.
Depois de passarmos duas vezes em frente de determinada casa e depois de complicados códigos que identificavam os intervenientes na marosca e davam como livre a costa.  Deixei então o meu amigo e parti para uma ronda que tinha sido estipulada em cerca de uma hora, antes de voltar novamente para o recolher.
Essa hora foi aproveitada para fazer a ronda aos paióis que existiam na periferia da cidade e, passada quase uma hora fui-me aproximando do local onde teria que recolher o felizardo.
A noite estava escura, somente a luz que vinha de alguns candeeiros de iluminação pública, que criavam mais sombras do que iluminavam por mor dos ramos das árvores que camuflavam os postes de iluminação, davam um pouco de claridade.
Cheguei no principio da rua com os faróis do jeep   postos em médios que iluminavam apenas uns metros à frente da viatura.
Ao longe perto do sítio combinado para a “operação de resgate do desertor” pareceu-me ver um movimento estranho onde algo branco emergia da escuridão quase total. 
Desconfiado que qualquer coisa não estava bem aproximei-me com o jeep a baixa velocidade e quando achei que a distância era apropriada disse ao condutor que acendesse os faróis no máximo.
A surpresa foi geral. O meu amigo de meias calçadas e cuecas brancas com as botas e farda às costas, fazia gestos desesperados para que apagássemos as luzes do carro.
O resgate que por brincadeira tinha falado, foi mesmo um resgate a sério. Com os faróis apagados aproximamo-nos do local onde ele estava e depois de ele ter entra dono jeep arrancámos a toda a velocidade para um local mais seguro, onde ele se fardou a rigor.
A história fácil de contar: “O marido apareceu e o meu colega apenas teve tempo de sair pela Janela, caindo desastradamente numa poça de água que tinha ficado desde as chuvas da tarde.
O susto foi tão grande que ele durante o resto da comissão nunca mais lá voltou.

mco

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